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  • Foto do escritorUriel Gonçalves

Hora de definir: sua marca é um hábito ou um ritual?

Quando os hábitos dos consumidores mudam, são os rituais que ficam. Quando pessoas, marcas ou empresas dizem "vamos passar por isso juntos", ou "depois que a pandemia passar...", eles estão revelando mentiras disfarçadas de encorajamento.


Provavelmente não exista um "antes e depois" do COVID-19. Ao invés disso, veremos uma fatia de negócios fechando, outras reduzindo, e tudo isso amplificado por um embaralhamento das normas sociais e das quebras dos ideais que até hoje foram estabelecidas.


Se vamos no mercado hoje, já podemos observar que há demarcações no chão para as pessoas ficarem distantes, também podemos notar que já existem barreiras de distanciamento entre as pessoas e os caixas, em alguns locais, e em outros, já foram instalados vidros protetores, como vemos normalmente em lotéricas. As companhias aéreas voam cada vez menos. E o futuro ainda irá trazer hotéis ultra-higiênicos e restaurantes sem contato humano, isso só para começar.


Nós realmente não sabemos quando que isso tudo irá terminar, mas o que já temos certeza é que muitos dos nossos hábitos pré-COVID não existirão mais.

Quando os negócios reduzem a velocidade, o varejo se contrai, as empresas buscam novos modelos de negócios e nós, contrariados, abraçamos uma crise global. Agora é hora de perguntar: sua marca realmente importa para o consumidor?


Sua marca é um hábito ou um ritual?

Essa é uma questão importante porque existe uma grande possibilidade de que muitos dos nossos hábitos não irão sobreviver a esta fase, mas os rituais sim. E muitos dos nossos hábitos estão centrados nos produtos que compramos.


Hábitos tornam a vida mais fácil. Rituais tornam a vida mais significativa.


Em um estudo da Persky, do mês de abril, foi mostrado que 70% dos compradores da geração Millenial e Z já trocaram de marcas.

Muito dessa troca de marcas está acontecendo por problemas de distribuição, mas mesmo assim, 44% das pessoas que fizeram essas trocas, estão dispostas a se manterem comprando dessas novas marcas pós-pandemia.


A maioria das marcas e produtos são consumidos como hábitos. Existe uma tendência de repetir o mesmo comportamento de compra porque ele elimina um esforço ou uma barreira.


Nós compramos a mesma marca de salgadinhos, de roupas íntimas ou de objetos eletrônicos porque nós já conhecemos e confiamos nelas. Não é, necessariamente, porque são as melhores, mas porque o esforço envolvido em encontrar a melhor nos custa mais do que ficar com "o que tem pra hoje".


É por isso que quando há uma disrupção e esses hábitos são efetivamente quebrados, é muito mais fácil ficar com a nova solução, até a velha escolha ficar disponível de novo. Porém, enquanto grandes e pequenas marcas estão perdendo os seus consumidores por causa dos problemas de distribuição ou por lojas fechadas, existe um segmento que não está sofrendo as mesmas consequências.

A sociologista e executiva de marcas Ana Andjelic apontou o seguinte: "me mostre o que não está em crescimento, e vamos descobrir o porquê". Em um dos seus artigos recentes, chamando "Contradições, Inversões, Peculiaridades e Coincidências" (em tradução literal), ela aponta, incrivelmente, que reserva de viagens de cruzeiros para 2021 já estão maiores que as de 2019. Além disso, 76% das pessoas que cancelaram uma viagem em 2020 escolheram ficar com o crédito para uma futura viagem em 2021, comparado com 24% que optaram pelo reembolso.


E viagens de cruzeiro não são o único ponto fora da curva por aqui.


A fila de espera para se comprar uma Peloton (bicicleta ergométrica com tela, treinos por assinatura, e apontada como uma das grandes tendências da área fitness) é maior que dois meses. E só cresce.


Vemos as academias fechadas, ou com menor circulação, e as pessoas precisam, de alguma maneira, se exercitar. E o que parece é que os aplicativos e sistemas inteligentes de treinos em casa estão desfrutando de um retorno enorme, mesmo com as restrições sociais começando a diminuir.


Uma nova indústria caseira de festas de aniversário e chás de bebê surgiu das cinzas da pandemia. Quando todos pensamos "e agora, o que será dos aniversários?", empresas como Kiki Kit e Imagination Adventures Parties oferecem todo um planejamento experimental e sensorial de festas que transcende as limitações da típica videochamada. São experiências imersivas que, por acaso, têm uma tela.

Todas essas marcas tem uma coisa em comum: elas ritualizaram a experiências dos produtos.


Nós não lutamos por nossos hábitos, mas nós lutamos pelos nossos rituais.

Rituais atendem necessidades que nossos hábitos não conseguem. Eles trazem significado em um período onde nada faz sentido. Eles nos ajudam a marcar as mudanças e nós lembram quem nós somos, além do contexto que estamos inseridos.


Quanto mais os nossos hábitos são tirados de nós, mais a gente tende a querer proteger e preservar os rituais que nos definem.

Mesmo que o seu produto seja utilitário por natureza, ou que a sua marca pareça casual demais para ritualizar, existe uma forma de dar contexto à sua história para que você não seja mais consumido como um hábito.


Mas antes, é preciso entender o que faz dos rituais tão poderosos.


Decodificando a mecânica de um ritual

Como um ritual funciona?


Sasha Sagan, autora do livro "For Small Creatures Such as We", filha do astrônomo Carl Sagan e da produtora Ann Druyan, dedicou parte de sua vida e obra para encontrar significado e rituais fora das religiões tradicionais.


Enquanto hábitos proporcionam tranquilidade e consistência, rituais criam significado.

Segundo Sasha, rituais nos fornecem uma espécie de âncora, e quanto mais vezes eles acontecem, seja diária, semanal, mensal ou anualmente, eles ganham mais significado.


- Rituais nos ajudam a sentir a passagem do tempo e/ou apreciar essas mudanças.

- Rituais nos dão estabilidade, ordem e rotina em tempos caóticos.

- Rituais nos ajudam a santificar e a atribuir contexto em um momento.


E cada um desses benefícios emocionais está em alta demanda neste momento.


Parece loucura remarcar um cruzeiro ao invés de pedir reembolso, mas é importante lembrar que uma viagem de cruzeiro é um momento mais esperado do ano por muita gente. Ele ajuda a marcar a passagem do tempo.


Os 2.400 dólares investidos em uma Peloton parece exorbitante, dada as diversas opções mais baratas existentes no mercado para se exercitar em casa, mas a experiência documentada, compartilhada quase como um culto, proporciona estabilidade, ordem e rotina.


Aniversário, casamentos ou chás de bebê não apenas se tornaram digitais. Eles mudaram de local, artefatos, normas e linguagem, mas o ritual persiste como uma maneira de santificar o momento e extrair o contexto de um momento de nossas vidas.


É fácil descartar essas situação - marcas e produtos que surgiram como resultado de rituais que já existiam antes delas - mas isso seria desvalorizar o poder do storytelling para uma marca.


De fato, hoje existem oportunidades para marcas de todos os tipos posicionarem seus produtos como rituais, ao invés de hábitos, que vão ajudar as pessoas a obter pelo menos um daquele pilares de significado.


A empresa americana de carnes e embutidos, Oscar Mayer, criou o #FrontYardCookout (churrasco na frente de casa), convidando vizinhos a fazer seus churrascos na parte da frente da casa, ao invés de fazer nos fundos, como seria o tradicional Backyard Barbecue, criando um momento de conexão em meio ao distanciamento social.

Ao invés de falar de lanches rápidos ou de alimentar as crianças que estão em casa assistindo aulas online o dia todo, eles estão se envolvendo com uma tradição típica do verão americano.


A luz dourada, sombras e cadeiras dobráveis são lembrete de rituais de verão — momentos para reunir, reconectar e solidificar relacionamentos.


A Open Spaces, marca de produtos para organizar a casa, lançada ano passado pelos cofundadores Emmet Shine e Nicholas Ling da Pattern Brands, tem criado conteúdo e storytelling em volta do ato de limpar e organizar a casa.


Na série Space Tapes, eles exploram "as vidas da nossa comunidade, e o que as pessoas têm escutado". Cada música se conecta com uma história na vida de alguém, refletindo sobre o seu passado e trajetória de vida.


A Open Spaces vende itens de organização como cestas e bandejas, mas esse tipo de conteúdo traz significado ao ato de organizar a sua casa. É o ritual de organizar a sua mente, a sua alma e o seu coração.


Isso pode parecer um exagero, mas considerando a repercussão da Marie Kondo no mundo digital, não é absurdo que as pessoas vêm atribuindo um significado cada vez mais profundo às suas faxinas.

Uma marca de bem-estar sexual para mulheres, a Dame, começou uma série chamada Self-Love Sundays (Domingos de Amor Próprio) no mês de maio, começando com uma aula sobre auto-massagem.


Talvez não seja coincidência que o domingo, um dia considerado sagrado para muitos, inspire observação, pausa e gratidão. O conceito de amor próprio, mesmo que num contexto sexual, parece mais íntimo e importante ao ser celebrado num dia específico.

Os produtos que nós precisamos agora não são somente sobre facilitar e reduzir o esforço. Eles devem nos conectar, de qualquer maneira possível, às coisas que nos fazem sentir seguros de novo.


“A principal diferença entre razão e emoção é que a emoção gera ação, enquanto a razão leva a conclusões" — Donald Calne, neurologista

Rituais são feitos de emoções.

Se você acha que a sua marca está posicionada como um hábito, encontre maneiras de se comunicar em torno das emoções que a sua experiência evoca.


- Crie uma rotina nessa experiência que a associe a algum significado, celebração, lembrança ou o mínimo senso de normalidade.

- Ofereça um contexto que faça os usuários se sentirem parte de uma tradição maior, através de storytelling e conteúdo.

- Forneça significado, identidade ou destaque à passagem do tempo como algo especial.


Toda marca conta uma história. Pense nas histórias que o seu consumidor precisa agora, e comece a sua narrativa por ali. Essa é a hora de mudar de direção, ritualizar a sua marca e tentar um storytelling diferente.


Torne a sua marca significativa.

 

Adaptado do texto em inglês de Jasmine Bina, publicado no Medium, When Consumer Habits Fall Apart, Loof For The Rituals That Remain.

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